
A conseqüência
imediata dessa tese no ensino é a de que, para o marxismo, “educar não é pôr em
contato com a verdade e sim com a prática”. Mao-Tsetung afirmou que uma das
características do materialismo dialético “é o seu caráter prático; sublinha a
dependência da teoria à prática; que a prática é a base da teoria; que o
critério da verdade nada mais é que a prática social”.
A educação e o
ensino, para o marxismo, devem realizar, na prática, a vinculação do homem ao
sentido da História. “A educação é necessária e seu significado e sua tarefa
consistem em provocar a máxima aceleração no processo histórico e fazer
possível a transformação da consciência dos homens”.
Para o marxismo, a
única forma possível de educar consiste em lograr que consciente e livremente –
falamos de liberdade marxista – o educando se realize, por contradições
sucessivas na natureza e na história; “a educação marxista deve ser
interpretada como acomodação...a educação é uma atividade acomodadora à
situação revolucionária...educar é socializar”.
O professor
desempenha papel importante e “é fundamental que o ensino esteja em mãos de
professores ideologicamente doutrinados e capacitados para acender a chispa da
consciência comunista em seus alunos e, ademais de uma formação adequada, deve
ter, acima de tudo, uma consciência política. A Escola e o Ensino devem estar
permanentemente controlados para evitar a infiltração de resíduos e concepções
burguesas”
É esse o objetivo da
educação marxista: formar consciências comunistas.
E isso, como é
obtido?
O procedimento varia
segundo as circunstâncias. Não é o mesmo quando o marxista esteja no Poder, ou
quando ainda não tenha conseguido a tomada do Poder. Quando domina a sociedade
todos sabem como opera e, no outro caso?
Em primeiro lugar
devemos ter em mente que o marxismo não trata de melhorar nada, e sim fazer uma
transformação total, face ao seu próprio caráter dialético. A crítica do
marxismo a toda a injustiça real ou a toda situação que se apresente como
injusta, ou que se faça passar como tal, não tem por finalidade restabelecer a
justiça ou melhorar as coisas em seu melhor e mais amplo sentido, e sim inserir
o homem na dialética, lograr que os homens aceitem sua vinculação ao processo
dialético, que é aquilo que, para o marxismo, constitui o progresso.
O marxismo não se
preocupa com o proletariado porque ele esteja oprimido ou porque seja débil, e
sim na medida em que é uma força, e quanto mais proletários existirem maior
será sua força como classe revolucionária e mais próximo possível estará o
socialismo.
O objetivo confesso
dos marxistas é a tomada do Poder pela classe trabalhadora. Isso, todavia, não
significa que nada se possa fazer antes que o Poder passe às mãos dessa classe.
A luta pela melhoria da educação tem uma importância fundamental, pois sem a
dedicação a essa luta não podem tomar forma e desenvolver-se nem os meios para
tornar possível a ofensiva final, nem a ideologia que sustenta essa luta.
Daí a importância e
o perigo do marxismo nos centros escolares da sociedade em que este ainda não
tenha assumido o Poder. Perigo mais latente e real hoje, quando a doutrina
comunista pretende chegar ao final da história – comunismo – por meio da
conquista da sociedade civil, o que tornaria possível a subseqüente conquista
do Estado. Ou seja, a conquista da sociedade civil como prelúdio da conquista
da sociedade política, pois, conforme a terminologia de Gramsci, “antes de
tomar o Poder é preciso conquistar a cultura”.
Exemplo clássico de
derrota do marxismo, por não possuir a hegemonia na sociedade civil, foi a
sofrida por Salvador Allende, no Chile, em 1973.
Antonio Gramsci,
ideólogo marxista italiano, falecido na década de 30, e seus seguidores
eurocomunistas, descartam, por esse motivo, a violência revolucionária – que,
no entanto, admitem, em último extremo – e dão mais importância à educação
levada a cabo pelos intelectuais, considerando-a o principal fator
revolucionário. Desse modo pretende-se evitar que a forte personalidade da
sociedade civil nos países ocidentais se rebele contra o governo
revolucionário, levando-o ao fracasso, como ocorreu com Allende.
É impossível que uma
luta política possa culminar em verdadeiros resultados se não vier acompanhada
de ma revolução, de uma reforma intelectual e moral, se não se modifica a
mentalidade das pessoas e, por conseguinte, a superestrutura da sociedade. Por
isso, o problema da revolução é, também, um problema de educação.
Daí a importância da
Escola – na qual a política, a cultura e a pedagogia estão indissoluvelmente
unidas – que poderá vir a cumprir, com relação aos jovens, o mesmo fim que um
partido político.
Por tudo isso –
ainda, segundo Gramsci, a difusão, desde um centro hegemônico – a Escola – de
um modo de pensar homogêneo, é a principal condição para a elaboração de uma
consciência coletiva.
Direção, organização
da cultura, centro hegemônico, modo de pensar homogêneo, consciência coletiva,
escola unitária, tudo isso é destinado a impor que se assimile a filosofia da
práxis. Isto é, o marxismo, pela chamada sociedade civil.
No fundo, no
entanto, nada mudou. Trata-se da instrumentalização da cultura e do ensino para
atingir o objetivo visado pelo marxismo: a submissão do homem, mediante a
submissão da inteligência.
Volodia Teitelboim,
que foi membro da Comissão Política do Partido Comunista Chileno durante o
governo Allende, referiu-se ao tema abordado neste artigo na Revista
Internacional número 1/1982: “Quem controlar a cultura e sua base
imprescindível, a educação, poderá não só definir retrospectivamente o
acontecido como também controlar o futuro”.
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Carlos I. S.
Azambuja é Historiador.
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