Por Gabriel Castro, de Brasília – VEJA
No alto escalão petista, consolida-se a tese de que a
presidente age da forma oposta à esperada para demonstrar poder diante do
partido e de seu mentor
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Presidente do Uruguai, Pepe Mujica, Dilma Rousseff e o ex-
presidente Lula participam da
comemoração
aos 35 anos do PT em Belo Horizonte (MG) (Ricardo Bastos/Estadão
Conteúdo)
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Na quinta-feira, véspera do anúncio de que Aldemir Bendine
foi escolhido como novo presidente da Petrobras, o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva queixava-se a aliados da falta de disposição de Dilma Rousseff em
dialogar e ouvir seus conselhos. A troca de comando na estatal era o exemplo
mais recente: Lula sugeriu os nomes do ex-presidente do Banco Central Henrique
Meireles, do executivo Antonio Maciel Neto e o presidente do BNDES, Luciano
Coutinho. Dilma não aceitou e, no dia seguinte ao desabafo de Lula, confirmou a
tese ao nomear um nome que desagradou o corpo de funcionários da companhia e não
fora aventado em momento algum.
No alto escalão petista, consolida-se a tese de que a
presidente às vezes age da forma oposta à esperada justamente para demonstrar
poder diante do partido e de seu mentor.
A tensão entre o partido e o governo, entre as propostas do
ex-presidente e as decisões de Dilma, sempre existiu. Mas agora, com a crise no
governo, tornou-se mais evidente. Atingido em cheio pela operação Lava Jato,
que investiga os desvios da Petrobras, o partido sofre com o esvaziamento da
base aliada no Congresso e, apesar de comandar o governo, não se vê
representado nas decisões de Dilma.
A queixa principal é a de que a chefe do Executivo não ouve
ninguém além do seu restrito círculo de conselheiros. Atualmente, o nome mais
influente do governo é o do ministro da Casa Civil, Aloísio Mercadante. Lula
credita a ele parte das decisões desastradas do atual governo, como a escolha
de nomes controversos para o ministério e a desastrada sucessão na Petrobras,
que derrubou as ações da empresa.
O ex-presidente também acredita que Pepe Vargas não está
preparado para comandar as Relações Institucionais. Tampouco confia no poder do
ministro Miguel Rossetto, a quem vê como incapaz de instigar os movimentos
sociais a defender o governo. No segundo
mandato, o governo Dilma é mais dela e menos de Lula. E, para boa parte do PT,
é esse o problema.
Lula está numa encruzilhada, como ele mesmo reconheceu a um
interlocutor. O ex-presidente contou ter perguntado ao ditador cubano Raul
Castro como ele tratava as desavenças com o irmão Fidel. Ouviu a seguinte
resposta: "Tudo o que meu irmão fez de bom e ruim eu estava junto. Não
posso me desvencilhar". Lula, então, emendou: "Comigo e a Dilma, é a
mesma coisa". O ex-presidente, que pretende se lançar candidato novamente
em 2018, sabe que o agravamento da crise do atual governo pode prejudicar seus
planos para a próxima eleição. Mas não quer forçar um rompimento que pode ser
prejudicial ao partido.
A postura do ex-presidente reflete o clima dentro do PT.
Parlamentares da sigla já dizem abertamente que a bancada precisa se descolar
do governo neste mandato, dada a crônica falta de diálogo do Planalto com os
aliados no Congresso. "Não seremos linha auxiliar da oposição, mas também
não vamos baixar a cabeça para o governo", diz o deputado Reginaldo Lopes
(PT-MG). A formação da equipe ministerial e as medidas econômicas recentes também
desagradaram boa parte da militância. E a postura débil da presidente da
República diante da crise política causa o temor de que o Planalto seja
engolido de vez pelos acontecimentos.
Diferentemente de Lula em 2005, quando explodiu o mensal
o, Dilma não tem apoio massivo nas ruas
e nem possui grande poder de articulação política. Seu isolamento é visto como
um sinal perigoso por correligionários.
É por isso que o conselho dado pelo ex-presidente no ato que
marcou os 35 anos do PT, nesta sexta-feira, traz uma admoestação embutida:
"(Se houver) um erro desastroso nosso, quem vai sofrer não somos nós, é o
povo humilde desse país. E você em obrigação não de governar para o Lula e o
Rui Falcão. É governar cuidando do povo brasileiro".
Publicado originalmente na Revista VEJA