Na realidade, a Justiça Militar da União (JMU) não “teve
papel fundamental na execução de perseguições e punições políticas”, não
“institucionalizou punições políticas” e tampouco ampliou, para si mesma, sua
competência para o “processamento e julgamento de civis incursos em crimes
contra a Segurança Nacional”. Muito menos, foi a “retaguarda judicial [...]
para a repressão [...] conivente ou omissa às denúncias de graves violações de
direitos humanos”.
Nas recomendações finais, o Relatório sugere a “exclusão de
civis da jurisdição da Justiça Militar Federal”, pois consiste, segundo a
Comissão, em “verdadeira anomalia que subsiste da ditadura militar”.
O Relatório causa estranheza e o seu posicionamento ofende a
base principiológica do Superior Tribunal Militar (STM) e, por extensão, da
própria Justiça Militar da União.
Se a Comissão pretendia, no tocante à JMU, elucidar fatos
daquela época, não cumpriu o seu mister. Na verdade, os processos constantes
dos arquivos desta Corte demonstram exatamente o contrário. O Poder Judiciário
só age quando acionado e a JMU, à época dos fatos, assegurou os princípios
garantistas e os direitos humanos.
A exemplo da Justiça Eleitoral e da Trabalhista, a Militar é
ramo qualificado do Poder Judiciário, competente para o processo e o julgamento
de crimes em razão de sua especialidade, e não em face do agente, tudo em
consonância com os mandamentos constitucionais. Para clarear incompreensões,
esta Justiça é integrada por juízes civis que ingressam na carreira mediante
concurso público de provas e títulos, como todos os magistrados. Os indicados
para integrar o STM são submetidos à apreciação do Congresso Nacional e, por
fim, nomeados pela Presidência da República.
Olvidou o Relatório, ainda, que a Justiça Militar foi criada
em 1808, sendo a mais antiga do Brasil, e integra o Poder Judiciário desde a
Carta de 1934. Portanto, a Justiça Militar não floresceu no regime militar ou
no período analisado pela Comissão.
A Justiça Militar sempre edificou exemplos de independência,
coragem, imparcialidade e isenção ao julgar, conforme espelham decisões
memoráveis, como a que reformulou a sentença condenatória proferida em desfavor
de Luis Carlos Prestes, e, ainda, a que deferiu liminar em Habeas Corpus,
exatamente no período em contexto, a qual serviu de precedente para o próprio
Supremo Tribunal Federal.
A propósito, a primeira vez que Defensores Públicos atuaram,
no Judiciário Brasileiro, foi justamente perante o STM. Vale, ainda, enfatizar
os posicionamentos de ilustres juristas e advogados que atuaram junto a este
Tribunal, durante aquele período conturbado, como Sobral Pinto, Heleno Fragoso,
Evaristo de Moraes e Técio Lins e Silva que atestam a postura independente,
transparente e imparcial desta Corte em seus julgados, evidenciando espírito
democrático e respeito à dignidade humana.
Nesse sentido, destaca-se o discurso do renomado advogado
TÉCIO LINS E SILVA, em 1973, quando da instalação do STM em Brasília:
“[...]os anos se passaram e esta Corte não só se firmou no
setor judiciário, como se impôs perante toda a nação como um tribunal de
invejável sensibilidade, atento, seguro, digno e sobretudo independente. Os
processos trazidos a esta Corte, tantas vezes envolvendo questão política – nos
casos de Segurança Nacional - não abalaram, não afastaram sentimento de Justiça
e equilíbrio que fez com que este Tribunal merecesse de todo o povo a admiração
e o respeito.”
Por fim, entende-se, como inverídicos, injustos e
equivocados, os conceitos contidos no relatório da Comissão Nacional da Verdade,
a respeito da Justiça Militar da União, cuja atuação tem contribuído à
estabilidade pátria desde a sua criação há 206 anos.
Publicado originalmente no site do STM - Superior Tribunal Militar