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Através dos tempos, muito já foi escrito sobre o comunismo e
a doutrina pretensamente científica que iria transformar o mundo, criar o
homem-novo e conduzi-lo ao Paraíso.
Em 1997, foi editado na França – e em 1999 no Brasil - já
tendo sido traduzido em 17 idiomas, o “Livro Negro do Comunismo”, organizado
pelo historiador francês Stephane Courtois, um ex-maoísta convertido em crítico
feroz do marxismo. Ele argumenta que o crime é intrínseco ao comunismo e não
apenas um instrumento de Estado ou um desvio stalinista. Na França, o livro já
vendeu mais de 170 mil exemplares, e na Itália, a primeira edição, com 30 mil
exemplares, está esgotada.
O livro, com 846 páginas, é fruto do trabalho de diversos
historiadores e o primeiro compêndio abrangente dos crimes cometidos em todo o
mundo pelos regimes comunistas e pelos partidos e movimentos revolucionários de
inspiração marxista, desde a Revolução de Outubro.
Pela estimativa dos autores - que tiveram acesso aos
arquivos da antiga União Soviética - as ações dos comunistas causaram cerca de
85 milhões de mortes. Destas, a maioria teria sido na China (60 milhões) e na
ex-URSS (20 milhões). Na América Latina, os mortos teriam sido 150 mil, em
Cuba, Nicarágua e Peru.
Eis a aritmética da matança: 60 milhões na China; 20 milhões
na ex-União Soviética; 2 milhões no Cambodja; 2 milhões na Coréia do Norte; 1,5
milhão no Afeganistão; 1 milhão no Vietnã; 1 milhão nos países da Europa
Oriental; e 150 mil na América Latina. A lista dos crimes de STALIN contra a
humanidade é especialmente longa e horripilante, envolvendo mais de 10 milhões
de pessoas. Ele cometeu o crime de genocídio, conforme definido pelos tribunais
internacionais, em diversas ocasiões: contra os kulaks russos, em que um
genocídio de classe substituiu o genocídio de raça, em 1930/1932; contra os
ucranianos em 1932/1933; contra os poloneses, bálticos, moldavos e bessarábios,
em 1939/1941 e, de novo, em 1944/1945; contra os alemães do Volga em 1941, os
tártaros da Criméia em 1943, os chechenos em 1944 e os inguches em 1944.
O XVI Congresso do Partido Bolchevique foi realizado em Jun
34. Quando da votação para o Comitê Central, realizada por voto secreto, 292
delegados votaram contra Stalin, que ficou atrás de todos os demais candidatos.
A vingança do ditador, assim desafiado pelos delegados, seria terrível. Em
1936-1938, Stalin liquidou 60 dos 63 membros da Comissão de Contagem de Votos,
a maioria dos delegados ao Congresso (1108 em 1936) e a maioria dos membros do
próprio Comitê Central eleitos nesse Congresso (98 em 139 efetivos e
suplentes).
Essa contabilidade do horror, no entanto, não chega a ser
nenhuma novidade. Em 30 de outubro de 1997, quando do 80º aniversário da
Revolução Bolchevique, o jornal“Izvestia” publicou uma ampla reportagem sobre
essas matanças, sob o título “Outubro, 1917-1997”.
Às vésperas da Revolução de Outubro, Lenin abordou a questão
do Estado em seu livro “O Estado e a Revolução”: “Aqui, o organismo de
repressão é a maioria da população e não a minoria, como sempre tinha
acontecido no tempo da escravatura assalariada. Ora, na medida em que é a
maioria do povo que domina os seus próprios opressores, deixa de haver
necessidade de um poder especial de repressão. É nesse sentido que o Estado
começa a extinguir-se”.
TROTSKY tinha outra opinião: “Qualquer que seja a
interpretação que se dê ao Estado soviético, uma coisa é incontestável: ao fim
dos seus primeiros 20 anos, ele está longe de ter ‘definhado’; ele nem sequer
começou a ‘definhar’; e o que é pior, tornou-se um aparelho de coerção sem
precedentes na História. A burocracia, longe de desaparecer, tornou-se uma
força incontrolável dominando as massas; o Exército, longe de ser substituído
pelo povo em armas, formou uma casta de oficiais privilegiados na cúpula da qual
apareceram marechais, enquanto que o povo, exercendo a ditadura através das
armas, nem sequer pode possuir uma arma branca em toda a URSS”.
Segundo o “Izvestia”, o comunismo eliminou pelo menos 110
milhões de pessoas em todo o mundo. Ou seja, nos 23 países do chamado bloco
comunista, dois terços do total das vítimas causadas por todos os regimes
ditatoriais do Século XX.
A título de comparação, a reportagem citou que a Alemanha
nazista, no período de 1933 a 1945, foi responsável pelo extermínio de apenas
21 milhões de pessoas.
Para o “Izvestia”, Stalin pode ser considerado “o maior
facínora do Século”, cujo regime assassinou 42,6 milhões de pessoas. A seguir,
aparece Mão-Tsetung, com 37,8 milhões, a partir de 1923, ou seja, muito antes
de 1949, quando ele criou a República Popular da China.
Segundo o organizador do “Livro Negro do Comunismo”,os dados
recolhidos por sua equipe estariam demonstrando que a violência é um elemento
intrínseco à ideologia e à praxis comunista. Em seu longo prefácio, Courtois
vai além disso, chegando a comprar o “genocídio de raça” (o Holocausto dos judeus), perpetrado pelos
nazistas, ao “genocídio de classe”, teorizado e posto em prática pelos
comunistas.
Um agora ex-comunista, que foi 1º Ministro da Itália,
Mássimo D’Alema, definiu o sistema soviético como “uma forma odiosa e terrível
de opressão”, enquanto Pietro Ingrao, um ex-lider do Partido Comunista
Italiano, sublinhou as “conseqüências nefastas” da “interpretação da política
como enfrentamento militar”, típica de todo o pensamento leninista.
O livro é, em suma, o balanço de uma relação histórica entre
comunismo e violência. Entre marxismo e despotismo. Foi escrito para aqueles,
que em todo o mundo, pregam um retorno a Marx e ainda buscam fazer um
boca-a-boca na doutrina, acreditando que ela não desapareceu totalmente.
O certo é que ela deixou marcas profundas. O tema de fundo
da obra é a descrição do terror prolongado e ininterrupto como característica
essencial da política soviética desde que, em 1919, Lenin fundou o Komintern,
definindo-o como “o estado-maior político e ideológico do movimento
revolucionário do proletariado”.
Assim, tendo por base a estrutura orgânica do Komintern, e
por seu influxo direto, surgiram todos os partidos comunistas do mundo e, sob
sua égide, foi concretizado o sonho de Marx e Engels de constituir uma
organização mundial destinada a ganhar todas as nações para o comunismo, e, a
partir daí, uma vasta e vaga nebulosa, denominada pelo vocabulário do
Komintern, de amplas massas.
Em troca da adesão ao Komintern, este outorgava aos demais
partidos a patente de revolucionários, numa relação periferia-centro que por
cerca de 70 anos ficaria conhecida como Movimento Comunista Internacional.
A obsessiva imitação dos partidos comunistas de todo o mundo
à imagem do PC Soviético recebeu o nome debolchevização. Ou seja, uma ideologia
compartilhada, onde a política passou a ser traduzida nos termos de uma
linguagem simultaneamente sagrada e fictícia. Uma espécie de Clero, destinado,
como tal, não a ser compreendido, mas a ser acreditado piamente.
Após a II Guerra Mundial, a indiscutível constatação, por
todo o mundo, da contribuição da União Soviética para a derrota do nazismo
conduziu à não avaliação que as nações “libertadas” pelo Exército Vermelho,
passaram a ser submetidas a um regime tão totalitário quanto o nazista.
Em todos os lugares em que o comunismo, sempre pela força,
se instalou, ele produziu terror, sem exceções. Alguns poderão dizer: “Ora,
isso nós já sabíamos a um tempão”. Todavia, a importância e novidade do “Livro
Negro do Comunismo” reside na divulgação da ampla dimensão em que os autores
realizaram o exame radiográfico desse regime de terror. Essa obra é a primeira
através da qual se poderá aprender que não existe país onde, após instaurado um
regime comunista, não tenha sido imposto, em seguida, um regime de terror.
Podem variar os mecanismos do exercício desse terror, a
quantidade e qualidade das vítimas, mas sempre, em todos os lugares - temos que
repetir com força, emtodos os lugares - com idêntica ferocidade, esteve
presente a arbitrariedade e a enormidade do uso da violência para a busca e
manutenção do poder total.
Esse universalismo despótico é imanente à própria natureza
do comunismo histórico. O “Livro Negro do Comunismo” oferece provas
irrefutáveis de que é assim como descrevemos e, nesse sentido, os que ainda têm
dúvidas poderiam perguntar-se se a forma despótica desenvolvida quando no poder
não seria congênita à própria essência da doutrina. Os que, ingenuamente ou de
má fé, ainda tentam sua defesa assinalam que “o comunismo realmente existente
foi uma forma degenerada do comunismo idealizado por Marx”. Dessa forma, Stalin
ou Mao não teriam sido senão “desvios” ou“degenerações” do comunismo. Todavia,
como e por que motivos esses “desvios” e essas “degenerações”ocorreram sempre,
sem exceção, em todos os lugares?
Há várias respostas, mas a colocação de Trotsky, o
comandante do Exército Vermelho, já em 1920, talvez seja a mais importante de
todas: “colocada à revolução a tarefa da abolição da propriedade privada -
coisa que nenhum regime jamais tentara - não haverá outro caminho a não ser o
de um poder ditatorial”.
Diz a doutrina científica que os partidos comunistas
conhecem as leis do desenvolvimento da História. Nesse sentido, quem acredita
conhecer essas leis se desresponsabiliza moralmente, pois acredita que aqueles
que obstam a História devem ser varridos do mapa.
Uma das razões, talvez a principal, para se continuar a
luta, sem esmorecimento, contra a ocultação da natureza intrinsecamente
totalitária e criminosa do comunismo, é a de que, mesmo tendo recuado
consideravelmente depois do desmoronamento da União Soviética, ele prossegue
sendo uma esperança para os inimigos da liberdade, sempre dispostos e ávidos a
instalar a opressão em nome dos oprimidos.
Finalmente, um resumo dos chamados “PROCESSOS DE MOSCOU”
PRIMEIRO PROCESSO:
É o Processo dos 16, iniciado em 19 Ago 1936. Os principais
acusados são representantes da velha guarda bolchevique, como ZINOVIEV,
KAMENEV, EVDOKIMOV e BAKAIEV, personalidades como PICKEL e REINGOLD, militantes
da oposição de esquerda como SMIRNOV e MRARCHOVSKI, e oficiais aviadores como
DREITSEN. Estavam incluídos também o escritor e jornalista TER VERGANIAN e o
alto funcionário GOLTSMAN.
Todos foram acusados de participar de “um centro” incumbido
de preparar e executar atentados terroristas contra os dirigentes do partido e
do Estado. VICHINSKY, o promotor nesses processos, declara que é preciso
“fuzilar esses cães raivosos, esses palhaços, esses pigmeus, esses
aventureiros”. Embora ausente, TROTSKY era o principal acusado, denominado
“alma e organizador do bloco terrorista”, segundo as “confissões”dos acusados.
A 25 Ago 1936, seis dias depois de iniciado o processo, os
16 acusados foram considerados culpados e executados.
2º PROCESSO
Desenrola-se de 23 a 30 Jan 1937 diante do mesmo tribunal.
Dessa vez foram 18 os acusados: PIATAKOV, RADEK, SEREBIAKOV, DROBNIS,
SOKOLNIKOV, MURALOV, etc. O esquema geral não diferiu do anterior. Todos são
acusados de “reconstruir o centro trotskista-zinovievista”, visado desde
o“envenenamento coletivo” até a sabotagem econômica. Só compareceram ao tribunal
os que “confessaram”. O promotor VICHINSKY procurou provar que era TROTSKY quem
puxava os cordéis. O veredicto é de 15 condenações à morte. PIATAKOV, RADEK e
SOKOLNIKOV são condenados à reclusão.
3º PROCESSO
Foi o chamado Processo dos Generais. A 11 Jun 37 um
comunicado anunciou a prisão e julgamento, no mesmo dia, de um grupo de
generais que incluía TUKHATCHEVSKY, IAKIR, OUBOREVITCH, FELDMAN e outros
oficiais do Exército Vermelho. Alguns deles já estavam presos desde 1936. Não ficou
claro se um julgamento verdadeiro foi realizado. As execuções dos generais
praticamente decapitam o Exército Vermelho às vésperas da 2ª Guerra Mundial.
4º PROCESSO
Ocorre entre 02 e 13
Mar 1938. 21 foram os acusados. Comparecem KUKHARIN, RYKOV, RAKOVSKY,
KRESTINSKY, IAGODA (ex-Chefe de Polícia), ex-comissários do povo, como
GRINKO e TCHERMOV, antigos membros do
CC, diversos funcionários e três médicos, e ainda um punhado de indivíduos
duvidosos e delatores. Todos foram acusados de “formar um bloco de direitistas
e trotskistas” e de ter, por intermédio de TROTSKY, concluído um acordo para
derrubar o poder soviético e desmembrar a União soviética em proveito de
potências inimigas. 19 foram executados.
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Carlos I. S. Azambuja é Historiador.