Por Denis Lerrer Rosenfield
Convém relembrar que a Lei da Anistia foi o instrumento que
tornou possível a transição democrática
Na quarta-feira, 10 de dezembro, foi apresentado o Relatório
da Comissão da Verdade, que, com mais propriedade, deveria ser chamada de
Comissão da Parcialidade ou do Revanchismo. Entre outras pérolas, terminou
responsabilizando Presidentes, Ministros das Forças Armadas, Comandantes
Militares que nada tiveram a ver com a tortura.
A Lei da Anistia foi o instrumento que tornou
possível a transição
democrática.
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Daí... Veja no que "deu"... |
O General Leo G. Etchegoyen, no Rio Grande do Sul, é mesmo
considerado, por militantes dos direitos humanos no Sul, um homem honrado. Seu
filho, General Sergio W. Etchegoyen, membro do Alto Comando, e sua família,
reagiram com altivez e coragem contra essa calúnia. Com propriedade,
qualificaram o relatório de “leviano”. Outros exemplos seriam igualmente
possíveis.
O objetivo maior da comissão consiste em um ataque à própria
Instituição Militar, procurando incompatibilizá-la com os cidadãos brasileiros.
O que se extrai da conclusão do seu relatório é que todos os militares seriam
golpistas, potencialmente torturadores e adeptos da ditadura. Necessitariam,
portanto, ser “corrigidos” e “julgados” por estes comissários que se colocam na
posição de um “Tribunal da História”.
Note-se que, dentre as recomendações, consta a de que as
academias militares deveriam seguir um novo currículo baseado nos “direitos
humanos”, isto é, na concepção ideológica desta esquerda que reivindica para si
a “propriedade” desses direitos. Os “direitos humanos” seriam submetidos a uma
narrativa ideológica que passaria a orientar a cabeça dos novos militares, à
semelhança do que ocorre na Venezuela, onde são obrigados a juramentos
castristas.
Arbitrariamente, a comissão delimitou a sua investigação aos
agentes de Estado que cometeram violências, deixando de fora as violências
cometidas pela esquerda armada. Houve uma escolha ideológica que já tornou
parcial o resultado de seu trabalho. A Comissão da Verdade, em seu escopo
original, deveria ter como objeto todos os lados envolvidos no conflito e não
somente um. Deste modo, a narrativa por ela construída termina por falsear a
sua pesquisa, produzindo uma espécie de revanche ideológica e política.
Por exemplo, teria produzido depoimentos sigilosos de
torturadores que, abrigados pela Lei da Anistia, poderiam falar sem medo.
Ameaçados de serem responsabilizados criminalmente, calaram-se. O Brasil perdeu
uma oportunidade histórica. Aliás, a comissão, salvo no caso das circunstâncias
da morte do deputado Rubens Paiva, nada produziu de novo, que já não constasse,
em linhas gerais, do extenso documento “Tortura nunca mais”. Poderia, também,
ter utilizado o livro produzido pelos militares, “Orvil” (livro ao inverso),
com uma detalhada narrativa de todo esse período de luta contra a esquerda armada.
Peculiar é a concepção destes comissários dos “direitos humanos”. Ao descartarem as vítimas dos assassinatos esquerdistas, em torno de 120 militares, policiais e civis, além dos que foram objeto de justiçamentos por ditos “tribunais revolucionários”, eles terminaram considerando-os como não caindo sob o conceito de “humanos”, desprovidos como se fossem destes “direitos”. Ou seja, os que não encarnaram a luta “revolucionária” não são propriamente humanos, nem merecendo uma pesquisa histórica. Agora, os que lutavam pela “ditadura do proletariado”, procurando implantar entre nós o totalitarismo esquerdista, ganham o nome de libertários e defensores da democracia.
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Peculiar é a concepção destes comissários dos “direitos humanos”. Ao descartarem as vítimas dos assassinatos esquerdistas, em torno de 120 militares, policiais e civis, além dos que foram objeto de justiçamentos por ditos “tribunais revolucionários”, eles terminaram considerando-os como não caindo sob o conceito de “humanos”, desprovidos como se fossem destes “direitos”. Ou seja, os que não encarnaram a luta “revolucionária” não são propriamente humanos, nem merecendo uma pesquisa histórica. Agora, os que lutavam pela “ditadura do proletariado”, procurando implantar entre nós o totalitarismo esquerdista, ganham o nome de libertários e defensores da democracia.
Perdeu-se, também, uma oportunidade de ouro de uma pesquisa
voltada para o financiamento destes grupos da esquerda armada, além de suas
concepções manifestamente não democráticas. Uma investigação deste tipo teria
produzido, aí sim, uma narrativa fidedigna do período, mostrando o
financiamento cubano de alguns destes grupos, maoísta de outros. Também seria
possível conhecer os seus treinamentos, por exemplo, na ilha dos irmãos Castro,
que se caracteriza por violências sistemáticas contra a oposição, as liberdades
civis e religiosas, além de descartar qualquer forma de representação
democrática. Seria interessante conhecer o currículo do que foi ensinado em
suas academias militares. Outra pesquisa de maior valia seria uma análise de
seus documentos onde primam as concepções leninistas, afastadas, evidentemente,
de qualquer comprometimento com a democracia e as liberdades.
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Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul