Antes que siga, noto: é espantoso que dois comandantes de
uma universidade federal assinem um texto com erros em penca de pontuação,
concordância (“vem” em vez de “vêm”), crase (à quaisquer), conjunção (se em
lugar de “que”), o diabo a quatro… O estilo é pedestre, com repetição viciosa
de palavras, ausência de paralelismo, anacolutos… Luiz Inácio Lula da Silva
teria se desincumbido da tarefa com mais brilho.
As barbaridades gramaticais do reitor e vice-reitor informam
o estado miserável a que foram reduzidas as universidades federais no país. Não
me espanta que um pró-reitor encaminhe a seus subordinados um pedido urgente
para que informem a eventual presença de alunos e professores israelenses na
instituição. Não é que analfabetos possam ceder naturalmente a pressões de
grupos antissemitas. É que, no caso específico, o analfabetismo literal é só
mais um brocado do analfabetismo ético e moral.
Leiam a nota como está lá no site — já fiz uma foto dos
crimes cometidos também contra a língua para registro histórico (segue depois
da transcrição). Volto em seguida.
Considerando os recentes ataques sequenciais dirigidos à UFSM, primeiramente em
referência à instalação da Comissão da Verdade no âmbito da UFSM e agora no que
diz respeito à solicitação de informações com base na Lei de Acesso à
Informação (12.527, de 18 de novembro de 2011) a Universidade Federal de Santa
Maria vem a público manifestar o seguinte:
1. Sobre as manifestações a respeito da Comissão da Verdade,
os fatos estão esclarecidos e as providências vem sendo tomadas no sentido de
preservar a instituição e seus compromissos basilares;
2. Não houve qualquer solicitação por parte da UFSM à
quaisquer de suas unidades acadêmico-administrativas de listas de Estudantes
e/ou Professores israelenses ou não vinculados academicamente;
3. A Pró-reitoria de Pós-graduação e Pesquisa, por demanda
do Gabinete do reitor, que por sua vez respondia, através do cumprimento do
Art. 10, da Lei de Acesso à Informação (obriga o atendimento dos pedidos feitos
por meio idôneo e devidamente assinados, e em seu parágrafo §3° impede de
questionar os motivos do pedido) a 05 perguntas das entidades representativas
(DCE, ASSUFSM, SEDUFSM e Comitê Santamariense de Solidariedade ao Povo
Palestino em de 14 de agosto de 2014), solicitou aos Cursos de Pós-graduação
tão somente se tinham ou não em suas equipes Estudantes e/ou Professores
israelenses vinculados (Mem. Circular 02/2015 – PRPGP/UFSM); em momento algum,
segundo fartamente divulgado, a UFSM buscou “identificar e apontar” pessoas de
origem israelense;
4. Na corrente semana o referido memorando circular foi
fraudado, distorcendo os fatos, e desta forma foi difundido pelas redes sociais
e páginas na internet, que além das manifestações de ódio vinculadas, originou
denúncia contra a UFSM; a UFSM, usando os meios legais está tomando as
providências no sentido de identificar os responsáveis e proceder os registros
processuais adequados de responsabilização por aquilo que julgamos extremamente
grave e ilícito;
5. Considerando a sensibilidade do tema, outras soluções
foram consideradas, antes de enviar dita solicitação aos programas. No entanto
todas elas representavam conflitos com a legislação vigente;
6. A Universidade Federal de Santa Maria sendo uma
instituição Pública respeitada nacional e internacionalmente, comprometida com
seus pilares de ensino, pesquisa e extensão, alicerçada sobre o conhecimento, a
democracia e o respeito às diferenças, não tem preferência no que toca às
históricas diferenças políticas, ideológicas, religiosas, etc… das causas
judaica e palestina nem a qualquer outro conflito desta natureza;
7. Até o momento não houve a consolidação de um documento de
resposta às entidades citadas, responsáveis pelas 5 questões apresentadas;
8. A UFSM espera que esta manifestação não sirva somente
para aplacar os ânimos contaminados por uma rede de versões baseadas numa
fraude, mas que sirva de reflexão no sentido de apostar na tolerância, no
respeito às diferenças, na democracia, na transparência, no diálogo e na paz
como instrumentos de justiça, convivência e felicidade.
Paulo Afonso Burmann, Reitor
Paulo Bayard Dias Gonçalves, Vice-reitor
Retomo
Também vou enumerar:
1) Então uma universidade pública cobra, num documento, que se informe a eventual presença de alunos israelenses na instituição e, chamada a se explicar, ainda tem a cara de pau de acusar perseguição?
Paulo Afonso Burmann, Reitor
Paulo Bayard Dias Gonçalves, Vice-reitor
Retomo
Também vou enumerar:
1) Então uma universidade pública cobra, num documento, que se informe a eventual presença de alunos israelenses na instituição e, chamada a se explicar, ainda tem a cara de pau de acusar perseguição?
2) O que a instalação da Comissão da Verdade tem a ver com
o caso em debate, além de nada? A quem estes senhores acham que enganam?
3) Releiam o item 3: o professor José Fernando Schlosser,
que encaminhou o pedido de informação, certamente cobrou de Burmann a verdade:
foi o reitor quem determinou o envio do memorando.
4) Reitor e vice-reitor estão fazendo pouco caso da
inteligência alheia. Um pedido feito com base na Lei de Acesso à Informação
pode, sim, ser recusado. Os que não forem atendidos terão, então, de recorrer à
Justiça.
5) Nesse caso, se recorressem, teriam perdido. A lei a
que os doutores se referem é a Lei 12.527. Leiam a íntegra. Quero que os dois valentes
provem que é de “interesse público” a informação sobre a eventual presença de
israelenses na UFSM. Mais: quero que ambos provem que as entidades sindicais e
o Comitê Santamariense de Solidariedade ao Povo Palestino são entes
legitimamente “interessados” na informação.
6) Releiam o documento original enviado à direção da universidade,
observem o que lá se diz sobre o estado de Israel e depois avaliem a decisão
tomada pela reitoria.
7) Reitor e vice-reitor insistem na falácia de que o
problema está na adulteração, com duas palavras de ordem em inglês, da
solicitação feita. Estão tentando nos enganar. O grave está no fato de o
pró-reitor — agora sabemos que, sob as ordens do reitor — ter encaminhado a
solicitação.
8) O item 6 da nota da reitoria é do balacobaco. Então a
UFSM não tem “preferência” em matéria de conflito israelo-palestino? Huuummm…
Isso quer dizer o quê? Se algum representante do Hamas quiser dar uma palestra
na UFSM, ele será bem-vindo? De resto, senhores, o único conflito religioso que
existe naquela área se dá entre os fundamentalistas do Hamas e o Fatah. De
resto, senhores, o único país em que árabes vivem numa verdadeira democracia é…
Israel!
9) A nota reforça a necessidade de destituição do reitor,
levando junto o vice. Pensam mal, escrevem mal e decidem mal. Pior: tentam
justificar uma decisão estúpida, de evidente caráter discriminatório, brandindo
uma lei que não os autoriza a fazer o que fizeram.
Para encerrar
Um idiota enviou um comentário para o blog perguntando por que estou tão incomodado se não sou judeu. Respondo com as palavras do teólogo protestante alemão Martin Niemöller:
“Um dia, vieram e levaram meu vizinho, que era judeu. Como não sou judeu, não me incomodei. No dia seguinte, vieram e levaram meu outro vizinho, que era comunista. Como não sou comunista, não me incomodei. No terceiro dia, vieram e levaram meu vizinho católico. Como não sou católico, não me incomodei. No quarto dia, vieram e me levaram. Já não havia mais ninguém para reclamar.”
Mesmo que os judeus ignorassem a questão, eu não ignoraria. Eu os defenderia, ainda assim, da sanha dessa gente. Entre outras razões porque isso também é um gesto de autodefesa.
Um idiota enviou um comentário para o blog perguntando por que estou tão incomodado se não sou judeu. Respondo com as palavras do teólogo protestante alemão Martin Niemöller:
“Um dia, vieram e levaram meu vizinho, que era judeu. Como não sou judeu, não me incomodei. No dia seguinte, vieram e levaram meu outro vizinho, que era comunista. Como não sou comunista, não me incomodei. No terceiro dia, vieram e levaram meu vizinho católico. Como não sou católico, não me incomodei. No quarto dia, vieram e me levaram. Já não havia mais ninguém para reclamar.”
Mesmo que os judeus ignorassem a questão, eu não ignoraria. Eu os defenderia, ainda assim, da sanha dessa gente. Entre outras razões porque isso também é um gesto de autodefesa.