Por
Percival Puggina
Escrevo
"povo" assim, entre aspas porque raras, raríssimas vezes, vi galerias
ocupadas por pessoas interessadas na defesa do bem comum, do interesse público.
Na maior parte dos casos, nas mais agitadas mobilizações, o "povo",
na verdade, é formado por corporações defendendo com veemência seus próprios
interesses. O povo, assim, sem aspas, estava sempre longe dali, tratando de
ganhar a vida, trabalhando mais de cinco meses por ano só para pagar impostos
ao poder público. Esse povo, pagador das contas, está sistematicamente
desinformado a respeito dos maliciosos eventos em que, às suas costas e custas,
são assumidos encargos que aumentarão sua conta com o fisco. Ou desqualificarão
os serviços que recebe.
Aliás, não
existem três possibilidades. Elas são apenas duas. Como o governo não tem um
único real que possa, legitimamente, chamar de seu, toda elevação do gasto
público significa necessidade de arrecadação maior ou redução de qualidade e/ou
quantidade nos serviços prestados.
Galerias
satisfeitas, com demandas atendidas, significam votos na urna para seus
entusiasmados benfeitores no andar de baixo. Há alguns anos, o Congresso
Nacional descobriu um filão que permite aos congressistas sair do varejo e promover
essas operações eleitoreiras no atacado. Refiro-me às conhecidas emendas à
Constituição que estabelecem pisos salariais ou estabelecer isonomias entre as
categorias mais numerosas ou politicamente mais ativas do serviço público. Tais
propostas invadem as competências dos Estados e municípios, cujos estreitos
orçamentos são abalados por decisões federais que lhes impõe encargos
insuportáveis. Verdadeiros atentados à Federação!
Por essas e
por outras, muitas outras, o RS, por exemplo, não consegue implementar o piso
nacional do magistério. Seu proponente foi Tarso Genro, quando ministro da
Educação. Meses mais tarde, coube-lhe, como governador eleito, pagar a conta.
Não conseguiu. Criou um contencioso multibilionário com a categoria. Ao que se
sabe, Tarso governador rompeu relações com Tarso ministro a ponto de negar-lhe
cumprimento.
A mais
recente versão dessa demagogia com o dinheiro do povo é a PEC que vincula os
salários das carreiras da Advocacia-Geral da União e de delegados civis e
federais a 90,25% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Também
estão incluídos procuradores de estado e de municípios com mais de 500 mil
habitantes. O custo total chega a R$ 2,4 bilhões por ano. O "povo", é
claro, lotava, na noite de ontem, as galerias da Câmara dos Deputados que,
sinfonicamente, aprovou o texto-base da PEC com votos favoráveis de 445
deputados. Apenas 16 deputados votaram contra por considerar que essa despesa é
incompatível com a crise econômica e fiscal em que o governo petista afundou o
país. Trata-se, realmente, de uma pauta-bomba, que vai estourar no nosso colo,
agravando a situação financeira da União, dos Estados e dos municípios.
______________
Percival
Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora
e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do
grupo Pensar+.
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