As declarações cardinalícias causaram consternação nos
opositores cubanos. O ex-preso político Ciro Alexis Casanova Pérez, que foi
considerado “prisioneiro de consciência” pela Anistia
Internacional, declarou com indignação que essa afirmação do cardeal Ortega
sobre a suposta inexistência de presos políticos em Cuba “é uma
total mentira”, e o incriminou por se dedicar a“apoiar a ditadura
dos irmãos Castro” (“Diario de Cuba”, 11 de junho de 2015).
Desde Cuba, o jornalista independente Mario Félix Lleonart
assinalou: “Beira o enigmático como alguém na posição deste homem se
preste a asseverar algo que ninguém acredita absolutamente, e que não lhe fez
nenhum favor, nem à Igreja que representa, nem a si mesmo. É óbvio que tão
desatinada declaração lança por terra toda a doutrina social da Igreja que é
chamado a respaldar e a praticar” (14 y Medio, 12 de junho
de 2015).
O ex-preso político Daniel Ferrer, que foi declarado
prisioneiro de consciência pela Anistia Internacional, lamentou desde a ilha: “Negar
que em Cuba haja presos políticos é mentir cinicamente e um seguidor Daquele
que morreu crucificado para salvar a humanidade e defender os humildes,
discriminados e perseguidos, não deveria se comportar de tal forma. O cardeal
Ortega não resulta ser um ‘Bom Samaritano’ (S. Lucas 10, 25) quando nega a
existência de presos políticos, quando não condena abertamente as flagrantes
violações aos direitos fundamentais dos cubanos, inclusive os direitos dos
católicos, e quando minimiza conscientemente a importância do trabalho dos que
lutam com amor pela liberdade, a justiça e o bem-estar da nação” (“Religión
en Revolución”, junho de 2015).
Por sua parte, a Comissão Cubana de Direitos Humanos disse
que as declarações do Cardeal não têm a ver com a realidade do país. “Agora
mesmo, há mais de 50 presos-políticos” (“Radio Martí”, 08 de junho
de 2015).
Na realidade, é difícil saber o número de presos-políticos
em Cuba, porque o regime constantemente detém e condena opositores muitas vezes
incriminando-os por delitos comuns, para ocultar que se trata de perseguições
políticas. Segundo a filosofia totalitária do regime e de acordo com as
disposições da Constituição e do Código Penal sobre as liberdades de religião e
expressão, elas somente se toleram na medida em que não se oponham à ideologia
comunista. Trata-se então de uma ilha-prisão cujos 12 milhões de habitantes
poderiam ser considerados como “prisioneiros de consciência”, subjugados por um
implacável torniquete jurídico-político-policial.
Recentes “solturas” de presos-políticos da ilha estão sendo
amplificadas por grandes meios de comunicação, e por altos líderes políticos e
religiosos como atos de liberalização do regime. Entretanto, os opositores já
fizeram notar que na linguagem “jurídica” cubana termos eufemísticos como
“soltura” e “licença extra-penal” significam “liberdades condicionais”,
cosméticas, que na atual conjuntura servem para facilitar as negociações com o
presidente Obama e para não desacreditar o mentor dessas negociações, o Papa
Francisco. Alguns recentes “libertados” estão sendo ameaçados pelos órgãos de
segurança de que a qualquer momento podem voltar à prisão para continuar
pagando por seus “crimes” contra o Estado comunista. A outros “libertados” se
lhes reteve toda a documentação, e ficam em uma espécie de limbo jurídico, como
párias dentro da sociedade comunista (La Vanguardia –Europa Press, 09 de
janeiro de 2015).
Na realidade, todas essas fraudes e farsas castristas são
conhecidas pelas embaixadas em Havana e pelas chancelarias do mundo inteiro,
especialmente pela secretaria de Estado dos Estados Unidos e pela secretaria de
Estado do Vaticano. O mesmo botox publicitário que agora o
regime aplica novamente por ocasião das negociações com os Estados Unidos, e em
função da próxima visita do pontífice Francisco, já havia sido aplicada nas
vésperas das visitas papais de João Paulo II e Bento XVI. Não obstante,
mantém-se um misterioso silêncio sobre essas farsas do regime cubano. E o
cardeal Ortega continuou e continua, como se não ocorresse nada, como Pastor do
desditoso rebanho católico cubano.
Talvez nunca antes na História tantos dirigentes mundiais
convergiram para salvar uma ditadura do naufrágio, como é o caso do regime
castrista. Os cubanos dentro e fora da ilha que dedicamos nossas vidas
a lutar, no plano das idéias, pela liberdade e dignidade de Cuba, estamos
dispostos a continuar desmascarando as manobras da ditadura castrista e
analisando publicamente as atitudes de seus altos protetores, esperando contra
toda esperança (Epístola aos Romanos, 4-18 e 19).
No caso do cardeal Ortega, por sua longa
trajetória de décadas de atitudes pró-castristas, estamos ante um
Pastor disposto a dar sua vida pelos Lobos, e não pelo rebanho a ele
encomendado, que encontra-se indefeso, órfão e desamparado.
É preciso dizer: todo este drama cubano, de quase seis
inimagináveis décadas de injustiça, miséria comunista e sangue, desenvolve-se
ante a Indiferença, com I maiúsculo, de boa parte da opinião pública mundial,
assim como ante a pertinaz e enigmática Colaboração, com C maiúsculo, de
considerável número de dirigentes e elites do mundo inteiro.
Que o bom Deus, ao qual neste momento recorro clamando por
Justiça, ajude o indefeso, órfão, desamparado, maltratado e dizimado rebanho
cubano e remova a Indiferença mundial sobre esse drama inimaginável.
_________________
Armando
Valladares, escritor, pintor e poeta, passou 22 anos nos cárceres políticos de
Cuba. É autor do best-seller “Contra toda esperança”, onde narra o horror das
prisões castristas. Foi embaixador dos Estado Unidos ante a Comissão de
Direitos Humanos da ONU sob as administrações Reagan e Bush. Recebeu a Medalha
Presidencial do Cidadão e o Superior Award do Departamento de Estado. Escreveu
numerosos artigos sobre a colaboração eclesiástica com o comunismo cubano e
sobre a “ostpolitik” vaticana sobre Cuba.
Pode-se ler o mais recente desses artigos, em espanhol e em
inglês, nos seguintes links:
Francisco, el nuncio y el tirano
Francis,
the nuncio and the tyrant
(Este artigo pode ser difundido livremente, em qualquer meio
de comunicação, sem necessidade de consulta prévia, opiniões, pedidos de
subscrição, remoção, etc., podem ser enviados a armandovalladares2012@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário