Por Percival Puggina
Primeira. A lei exige, como condição para
inelegibilidade, a existência de sentença condenatória, em decisão proferida
por órgão colegiado (Tribunal de Justiça, Tribunal Regional Federal ou mesmo
Tribunal do Júri). Ora, podem decorrer vários anos entre a prática de determinado
crime e a correspondente condenação por órgão colegiado. Um candidato inidôneo,
com bom advogado, disputará e exercerá vários mandatos antes de ser enquadrado
na condição de inelegibilidade imposta pela lei.
Segunda. Em fevereiro de 2012, quando o Congresso
Nacional aprovou essa lei de iniciativa popular, escrevi um artigo com o título
"Fichas limpas num modelo ficha suja". É dele o texto transcrito
abaixo:
E eu temo que a Lei da Ficha Limpa produza como resultado
apenas uma renovação dos quadros corruptos do país. Estaremos trocando
corruptos de ficha encardida por corruptos com ficha novinha em folha. Quando
digo isso, as pessoas me olham com incredulidade. Estão convencidas de que é a
maldade humana que corrompe nossas "primorosas" instituições. A
modelagem institucional do país não entra no foco de suas análises. O cidadão
brasileiro, via de regra, pensa em nomes, em pessoas, em indivíduos. Quando
avança um pouco mais pensa em ideias, princípios, valores. Mas raramente se
detém a examinar nossas instituições. Por esse motivo, estamos sempre tentando
consertar as consequências e desatentos às causas dos problemas. É como se
proclamássemos: "Abaixo as consequências! Longa vida às causas!"
Terceira. Muitos dos congressistas envolvidos na
operação Lava Jato eram participantes do mensalão. Durante aquele julgamento
não houve colaboração premiada e as condenações atingiram apenas os líderes dos
partidos integrantes do esquema, os quais mantiveram sigilo sobre os pagamentos
feitos aos seus liderados. Como consequência desse sigilo, da lei da camorra,
dezenas de parlamentares, cuja fidelidade ao governo era comprada a peso de
ouro, puderam disputar a eleição de 2014 ostentando como tecnicamente limpa uma
ficha efetivamente repulsiva.
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Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense
de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site
www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no
país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas
e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
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