Por Carlos I.S. Azambuja

A escola e o ensino, segundo os comunistas, devem ser
permanentemente controlados para evitar a infiltração de resíduos e concepções
burguesas. É esse o objetivo da educação marxista: formar consciências
comunistas. E isso, como é obtido?
Para o marxismo, a prática tem prioridade sobre o conhecimento e é o fundamento
deste. Essa é uma tese de Marx, que seus epígonos não hesitaram em manter e que
é a própria base do marxismo: a primazia da praxissobre o
conhecimento, da ação sobre a doutrina e do fazer sobre o ser.
A conseqüência imediata dessa tese no ensino é a de que,
para o marxismo, educar não é pôr em contato com a verdade e sim com a prática.
Mao-Tsetung afirmou que uma das características do materialismo dialético "é
o seu caráter prático; sublinha a independência da teoria à prática; que a
prática é a base da teoria; que o critério da verdade nada mais é que a prática
social".
A educação e o ensino, para o marxismo, devem realizar, na prática, a
vinculação do homem ao sentido da história. A educação é necessária, seu
significado e sua tarefa consistem em provocar a máxima aceleração no processo
histórico e em tornar possível a transformação da consciência dos homens.
Para o marxismo, a única forma possível de educar consiste
em lograr que, consciente e livremente - falamos da liberdade marxista - a
educação se realize, por contradições sucessivas, na natureza e na história; a
educação marxista deve ser interpretada como acomodação. A educação é uma
atividade acomodadora à situação revolucionária. Educar é socializar.
Para o marxismo, o professor desempenha um papel importante,
e é fundamental que o ensino esteja em mãos de mestres ideologicamente
doutrinados e capacitados para acender a chispa da consciência comunista em
seus alunos e, ademais, além de uma formação adequada deve ter, acima de tudo,
uma consciência política. A escola e o ensino, segundo os comunistas, devem ser
permanentemente controlados para evitar a infiltração de resíduos e concepções
burguesas.
É esse o objetivo da educação marxista: formar consciências comunistas. E isso,
como é obtido?
O procedimento varia, segundo as circunstâncias; não é o
mesmo quando o partido comunista esteja no poder, ou quando ainda não tenha
conseguido a tomada do poder. Quando domina a sociedade todos sabem como opera,
e, no outro caso?
Em primeiro lugar devemos ter em mente que o marxismo não trata de melhorar
nada, e sim fazer uma transformação total, face ao seu próprio caráter
dialético. A crítica do marxismo a toda injustiça real ou a toda situação que
se apresente como injusta, ou que se faça passar como tal, não tem por
finalidade restabelecer a justiça ou melhorar as coisas em seu real e mais
amplo sentido, e sim inserir o homem na dialética, lograr que os homens aceitem
sua vinculação ao processo dialético, que é no que consiste o progresso para
o marxismo.
O marxismo não se preocupa com o proletariado porque este esteja oprimido ou
porque seja débil e sim na medida em que é ou pode tornar-se uma força, e
quanto mais proletários existirem maior será sua força como classe
revolucionária e mais próximo e possível estará o socialismo.
O objetivo confesso dos marxistas é a tomada do Poder pela classe trabalhadora.
Isso, todavia, não significa que nada se possa fazer antes de o Poder passar às
mãos dessa classe. A luta pela educação tem uma importância fundamental, pois
sem a dedicação a essa luta não podem tomar forma e desenvolver-se os meios
para tornar possível a ofensiva final, nem a ideologia que sustenta essa luta.
Qualquer avanço no progresso educativo poderá vir, afinal, auxiliar o
desenvolvimento daconsciência de classe da classe
trabalhadora.
Daí a importância e o perigo do ensino do marxismo nos centros escolares da
sociedade em que este ainda não tenha assumido o poder. Perigo mais latente e
real hoje, quando os ensinamentos de Gramsci, de tomada não-violenta e indolor
do Poder pretende chegar ao final da história - o comunismo - por meio da
conquista dasociedade civil, o que tornará possível a subseqüente
conquista do Estado. Isto é, a conquista da sociedade civil como
prelúdio da conquista da sociedade política. Ou seja, antes de tomar o
poder é preciso conquistar a cultura, segundo a terminologia gramscista.
Exemplo clássico de derrota do marxismo por não possuir a hegemonia na
sociedade civil foi a sofrida por Allende, no Chile. Daí a tática comunista
adaptada à lição recebida. Uma vez conquistada a cultura, o caminho estará
livre à implantação do socialismo.
Gramsci, ideólogo marxista-leninista italiano, falecido na década de 30, e seus
seguidores, descartam, por esse motivo, a violência revolucionária - que, no
entanto, admitem em último extremo - e dão mais importância à educação levada a
cabo pelos intelectuais, considerando-a o principal fator revolucionário. Dessa
forma, pretende-se evitar que a forte personalidade da sociedade civil nos
países ocidentais se rebele contra um governo revolucionário, levando-o a
fracassar, como ocorreu no Chile em 1971-1973.
Ainda Gramsci: "É impossível que uma luta política possa
culminar em verdadeiros resultados se não vem acompanhada de uma revolução, de
uma reforma intelectual e moral, se não se modifica a mentalidade das pessoas
e, por conseguinte, a superestrutura da sociedade. Por isso, o problema da
revolução é também um problema de educação. (...) É necessário que o fato
revolucionário apareça não somente como um fenômeno de Poder, e sim, também,
como um fenômeno de costume, como um fato moral, o que implica,
necessariamente, numa radical transformação das mentalidades".
Daí a importância da Escola - na qual a política, a cultura e a pedagogia estão
indissoluvelmente unidas - que poderá vir a cumprir, com relação aos jovens, o
mesmo fim que um partido político.
Por tudo isso, ainda segundo Gramsci, "a difusão, desde um centro
hegemônico - a Escola -, de um modo de pensar homogêneo, é a condição principal
para a elaboração de uma consciência coletiva".
Direção, organização da cultura, centro hegemônico, modo de pensar homogêneo,
consciência coletiva, escola unitária, tudo isso é destinado a impor e a lograr
que se assimile a filosofia da práxis, isto é, o marxismo, pela
sociedade civil.
No fundo, no fundo, nada mudou. Trata-se da instrumentalização da cultura e do
ensino para atingir o objetivo visado pelo marxismo: a submissão do homem
mediante a submissão da inteligência.
Volodia Valentin Teitelboim Volosky, advogado, político, escritor e
intelectual, Secretário-Geral do Partido Comunista Chileno de 1988 a 1995,
referiu-se a esse tema na Revista Internacional nº 1-1982: "A
cultura é uma vaga e prestigiosa palavra em razão da qual, a seu juízo, os
povos e as nações conservam, continuam e até superam seu passado, Porém, quem
controlar a cultura e sua base imprescindível, a educação, poderá não só
definir retrospectivamente o acontecido como também controlar o futuro. O
amanhã se encontra nas mãos e no cérebro daqueles que estão sendo educados
hoje".
Publicado no site Alerta Total
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Carlos I.S. Azambuja é Historiador.
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