Por Fábio Blanco
Lembram-se da celeuma causada pelo candidato à presidência
da República, o sr. Levy Fidélix, quando ele falou algumas verdades sobre o
homossexualismo, tais como “dois iguais não fazem filho” e “orgão excretor não
reproduz”? Pois bem, por conta dessas declarações o candidato se tornou réu e
condenado em uma Ação Civil Pública, movida pela Defensoria Pública do Estado
de São Paulo, que pleiteou uma indenização no valor de um milhão de reais, em
virtude de supostos danos morais causados à comunidade LGBT.
Pouparei vocês da embromação jurídica da decisão, tomada,
como é de costume em nossos computadores forenses, do sistema de repetição
enfadonha de sentenças e despachos interlocutórios. Atento-me apenas aos
trechos mais relevantes, considerando a natureza da ação e do problema tratado.
Antes de tudo, peço que acompanhem minha análise sem
julgar-me como um defensor absoluto das palavras fidelixianas. O que penso
delas, neste momento, não vem ao caso. Quero apenas demonstrar, pela simples
transcrição e análise das partes do decisum, que o réu se encontrou envolvido
em um caso típico de processo dirigido, no qual nem o melhor jurista do mundo
poderia livrá-lo da condenação.
Isso porque, para início de reflexão, a magistrada
encarregada da decisão já possui um histórico de sentenças favoráveis aos
homossexuais. Isso, por si só, torna-a suspeita. Realmente não sei se ela
possui algum envolvimento extra-forense com grupos militantes favoráveis à
causa homossexual, mas suas decisões anteriores, como a dada no processo
0007609-79.2010.8.26.0100, da 11ª Vara da Família e das Sucessões, do Fórum
Central da Capital de São Paulo, demonstram, claramente, que ela tem uma ideia
bem favorável aos chamados direitos LGBT.
De acordo com a lei, isso pode até não torná-la passível de
suspeição, a ponto de impedi-la de julgar a ação proposta pela Defensoria
Pública, mas, na realidade, seu julgamento já está viciado por sua convicção
que, como ficará bem claro, não é nada juridicamente fundamentada.
Em sua sentença, a juíza afirma que o réu “ultrapassou a
liberdade de expressão assegurada constitucionalmente”. Para fundamentar seu
argumento, ela cita o parecer do Ministério Público, atuante no mesmo processo.
E este afirma que “as declarações do requerido negam a própria dignidade humana
à população LGBT”.
Aqui, me pergunto: que dignidade fora negada aos gays? Dizer
que não fazem filhos ou que de seus ânus não saem crianças é apenas uma
maneira, não das mais elegantes, de falar algo que qualquer pessoa sabe. Além
do que é a mais pura verdade. Pode-se até dizer que Fidélix foi grosseiro, mas
não que agredira a dignidade de um grupo. A não ser que a dignidade dos LGBT
esteja alicerçada na ilusão de que podem se reproduzir entre si.
A dignididade de alguém só pode ser medida pela realidade,
pela possibilidade. Dizer que um homem não pode voar não fere sua dignidade,
dizer que uma pessoa não pode viver duzentos anos não fere sua dignidade. E por
quê? Porque são impossibilidades reais. Da mesma forma, afirmar que dois homens
não podem conceber uma criança não fere em nada suas dignidades, pois ainda não
se inventou uma fórmula genética que os possibilite isso.
Mas o parecer do Ministério Público segue em um tom ainda
menos jurídico, como quando afirma do réu que “agindo dessa forma, propaga-se
discurso de ódio contra uma minoria que vem lutando historicamente, a duras
penas, pela garantia de direitos fundamentais mínimos. A exordial narra fatos
concretos e reiterados de agressões contra homossexuais em razão de sua opção
sexual, muitas das quais culminaram inclusive com a morte de vítimas”.
Primeiro, deve-se ressaltar o tom emocional do parecer.
Segundo, o uso de dados que são comprovadamente falsos, sobre supostas
agressões contra homossexuais, por conta de sua opção sexual. Terceiro, há algo
em Direito que se chama nexo causal, que é o vínculo entre o ato e suas
consequências. Aqui, o promotor tenta dar a entender que palavras como a do sr.
Fidélix são responsáveis por atos de violência contra homossexuais, ao dizer
que com elas propaga-se discurso de ódio. No entanto, esse nexo causal é apenas
presumido pelo próprio parquet. Ocorre que, no Direito esse nexo, para ser
presumido, precisa ter um vínculo notório com as consequências. No caso, porém,
isso não existe, simplesmente porque não se sabe de alguém que tenha agredido
homossexuais por causa do discurso do candidato ou de outros discursos que
poderiam ser considerados promotores de ódio. Portanto, a presunção do
representante do Ministério Público é uma mera dedução feita sobre seus próprios
achismos e, por isso, não pode basear juridicamente uma decisão.
Mas a juíza não contentou-se apenas em se apoiar no parecer
da promotoria e trouxe alguns argumentos próprios à decisão. No primeiro deles,
diz que o réu “empregou palavras extremamente hostis e infelizes a pessoas que
também são seres humanos (sic) e merecem todo o respeito da sociedade, devendo
ser respeitado o princípio da igualdade”.
Relevando as impropriedades lógicas e semânticas desse
pequeno trecho, é importante ressaltar que não há, nele, nenhuma afirmação
juridicamente relevante, que fosse capaz de conduzir a decisão a concluir pela
condenação. Isso porque palavras hostis e infelizes não são suficientes para
causar dano moral a uma coletividade. O mero desrespeito também não. Para que
isso ocorra, é necessário que as palavras sejam realmente ofensivas,
discriminatórias e segregacionistas. No caso, Fidélix falou apenas algumas
verdades biológicas, que não podem ser negadas por ninguém. É verdade que fez
ainda duas afirmações contestáveis, em relação a necessidade de tratamento
psicológico dos gays. Mas, convenhamos, seria isso suficiente para levá-lo a
uma condenação de um milhão de reais? Ora, o próprio Conselho de Psicologia,
até pouco tempo, tinha o homossexualismo como um transtorno psíquico. Como,
então, alguém citar isso pode ser considerado uma ofensa passível de
condenação?
No entanto, quando um juiz quer decidir a favor de uma das
partes, quase nada pode impedi-lo. Assim, então, continua a magistrada,
procurando razões para condenar o réu, como quando afirma que “a situação
causou inegável aborrecimento e constrangimento a toda população, não havendo
justificativa para a postura adotada pelo requerido”.
Ora, desde quando aborrecimentos e constrangimentos são
motivos para uma condenação milionária? Outra coisa: como ela pode afirmar que
as falas de Fidélix aborreceram e constrangeram toda população? A não ser que
ela considere que os que não se sentiram ofendidos com as palavras do candidato
e os que concordam com ele (que, certamente, alcançam um número expressivo de
pessoas no país) não fazem parte da população brasileira.
O que a julgadora está fazendo é uma presunção sem
fundamentos. Na verdade, ela toma sua própria indignação como de todos e,
assim, contamina sua análise. Isso fica claro na advertência que faz, ao
afirmar que não há justificativa para a postura adotada pelo candidato. Oras,
isso é jeito de uma juíza escrever, como se estivesse dando bronca em uma
criança? Não importa se as palavras de Fidélix têm ou não justificativas, o
papel da juíza é analisá-las e verificar se há alguma ligação entre elas e os
danos morais alegados.
Além disso, ela não pode presumir esses danos. Há casos que
os danos morais são presumidos, como quando um pai perde um filho, quando
alguém sofre uma falsa acusação etc. No caso, porém, os danos coletivos não são
presumíveis, já que as falas de Fidélix são, no máximo, deselegantes. O que a
juíza está fazendo é separar uma parcela da população, que afirma ter sido
ofendida pelas palavras do candidato, tomando-a como o todo. Tudo por
presunção, conforme a clara predisposição da própria julgadora.
Afirmo tal predisposição tomando como base o próprio trecho
seguinte da decisão, onde a juíza expõe claramente sua convicção em relação aos
direitos dos homossexuais ao reconhecimento de sua união estável. Ela afirma,
categoricamente, que “as uniões estabelecidas entre pessoas do mesmo sexo devem
ser reconhecidas e igualmente tuteladas”.
Ora, sem entrar no mérito da conveniência ou não da
concessão de direitos aos parceiros homossexuais, não é competência da juíza
estabelecer o que deve e o que não deve ser tutelado pelo Estado. Seu papel é
julgar conforme a lei e, pelo que sei, não há lei que estabeleça direitos
conjugais a pessoas de mesmo sexo. Além do mais, o que tem a ver esta questão
com o objeto da ação? Claramente, a magistrada tomou seu julgamento como um ato
de propaganda de direitos gays, fazendo de sua sentença um palanque para expor
suas convicções.
É evidente que essa magistrada faz parte de uma geração de
juízes que não se contentam em interpretar e aplicar a lei. Eles querem criar
direitos, mesmo que, para isso, precisem sobrepujar a vontade da população
refletida no sistema legal.
Isso fica claro no trecho de sua decisão, onde ela afirma
que “não é possível que o julgador adote posição de inércia, principalmente
considerando que o Direito deve servir de instrumento de pacificação social,
independente da opção sexual de cada indivíduo”.
Observem como ela atrai para sua função de julgadora o papel
que deve ser do Direito, que abrange muito mais funções do que a dos
magistrados. Assim, ela faz do Fórum lugar para ativismo social, afirmação de
lutas e antecipação de direitos.
Com uma juíza assim, nem os melhores advogados do mundo
seriam capazes de evitar a condenação do sr. Levy Fidélix. Quando a justiça,
que deveria ter, em sua fronte, uma venda, julgando, unicamente, conforme a lei
a que se submete, passa a decidir conforme as partes do processo, privilegiando
aqueles que ela considera detentores de direitos especiais, a ideologia sempre
vencerá.
Espero, apenas, que os senhores desembargadores do Tribunal
não estejam contaminados ideologicamente dessa maneira, e retomem a situação à
justiça esperada.
Publicado originalmente no site Discursos de Cadeira
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